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05/03/2024

Três perguntas para Dennis Duncan

Convidamos o autor de Índice, uma história do para responder três perguntas relacionadas ao seu livro

1. Seu livro é brilhante em desautomatizar a visão que temos de coisas cotidianas para pôr foco no índice, por exemplo a ordem alfabética, a relação entre índice e a organização de uma cozinha, a onipresente busca no Google e por aí vai. Houve exemplos que ficaram de fora, mas que você gosta de utilizar para explicar essa maravilhosa tecnologia?

Bem, há uma analogia que descobri e que uso muito quando estou falando desse livro. Algo que me perguntam muito é: “Por que os romances não têm índices?”. Acho que é útil lembrar quão incomum é a leitura de romances, em comparação com a maneira mais frequente que usamos os livros. Às vezes nos esquecemos de todos aqueles que lemos que não são romances: livros didáticos e manuais de instrução, livros de poesia e bíblias, livros de receitas, de medicina, de jardinagem, livros escolares, livros de história e monografias acadêmicas, e assim por diante. Os romances são extremamente incomuns, pois são quase os únicos casos — de todos esses tipos de livros — em que começamos do início, lemos até o fim e nunca lemos de novo. 

Então, por que os romances não têm um índice? Bem, se você imaginar uma estrada longa e reta, sem curvas, não é necessária nenhuma sinalização. Qual seria o objetivo? Mas quando você começa a imaginar curvas e estradas secundárias, quando começa a imaginar que as pessoas podem entrar ou sair da estrada em pontos diferentes, então você precisará de sinais para dizer a elas onde estão. E esse é o índice.

É curioso que quando as pessoas pensam em leitura, geralmente imaginam a leitura de romances, que na verdade é apenas uma pequena fração da leitura que fazemos todos os dias. Pense não apenas nos livros de receitas e manuais de instruções, mas também nos jornais, pôsteres, cardápios de restaurantes, placas de rua, e-mails, bilhetes, recibos, anúncios e pichações que lemos — às vezes sem nos dar conta — em nosso dia a dia. Mas essa é outra história. É nisso que estou trabalhando agora. 

2. Hoje em dia muito se fala em crise da atenção e da dificuldade que as pessoas têm de ler muitas páginas ou assistir mais de três minutos de um vídeo. Uma das discussões suscitadas ao longo do livro é se o índice é um atalho que prejudica a leitura e a aquisição de conhecimento. Como você vê essa questão?

Essa é uma ótima pergunta, e não tenho certeza de como me sinto em relação a ela. Por um lado, não tenho muita paciência com pessoas que dizem que a internet é péssima ou que a chamada Era da Distração é simplesmente algo terrível. Uma das coisas que eu queria mostrar em meu livro é que pessoas vêm apresentado esse argumento há milhares de anos. É possível encontrá-lo no Fedro de Platão — a ideia de que a invenção da escrita é algo ruim e que as pessoas se tornarão esquecidas (e sem graça) porque não precisarão mais confiar na memória. Há uma tendência — da qual não gosto — de sempre imaginar que mudança é retrocesso, que a maneira como fazíamos as coisas quando éramos jovens é a maneira adequada de fazer as coisas. Parece um pedaço de pau que uma geração usa para bater na que está chegando.

Por isso, neste livro, quis destacar que até mesmo algo tão fundamental e onipresente como a leitura está em constante evolução. Não lemos da mesma forma que os monges de um mosteiro medieval, ou da mesma forma que teríamos lido há duzentos anos, antes que tecnologias como o papel de celulose ou a composição mecânica barateassem a produção de revistas e romances populares (os chamados “pulp fiction””, devido ao papel barato).

A pergunta me faz pensar em como eu consumia música quando era adolescente, quando tinha que economizar dinheiro para comprar um álbum que você ouvia várias vezes, até o fim. Sem dúvida, havia coisas boas nisso. Mas também significava que meus gostos eram extremamente limitados e bastante tribais. Minha filha começou a se interessar por música há apenas alguns anos e os gostos dela já são muito mais amplos e ecléticos do que os meus eram. E isso ocorre porque a maneira como as pessoas ouvem música evoluiu. Não é algo simplesmente bom ou ruim, mas é diferente, e a evolução — até para a leitura — é inevitável.

Mas, mesmo assim, devo confessar que me preocupo com minha capacidade de atenção. Acho que todos da minha idade, que se tornaram adultos antes do iPhone, se preocupam. Não quero descobrir que perdi a capacidade de ler um romance muito longo, por exemplo. Mas então me lembro de que romances realmente longos sempre foram um grande compromisso. Nunca houve uma época em que fosse fácil ler Guerra e Paz, Ulisses ou 2666!

3. Você cita vários escritores que dedicaram seus trabalhos ou partes de livros aos índices, por exemplo Vladimir Nabokov, Virginia Woolf, Italo Calvino, Lewis Carroll, entre outros. Durante a pesquisa, como selecionou esses exemplos? Dentre eles, você tem algum preferido?

Quando um romance tem um índice, geralmente é uma espécie de piada — o romancista está brincando com nossas expectativas, fingindo que sua ficção é, na verdade, não ficção. Muitas vezes, ele anda de mãos dadas com outras piadas. O índice de Lewis Carroll em Algumas aventuras de Silvia e Bruno é muito divertido nesse sentido. Mas o índice de Nabokov em Fogo pálido consegue ser ao mesmo tempo espirituoso e comovente. O índice foi supostamente compilado pelo personagem principal do romance e, portanto, exibe aspectos da personalidade dele: pedante, rabugento e, por fim, trágico. É uma verdadeira obra-prima!

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